sábado, novembro 08, 2008

A Daslu e a cueca

por Sylvio Micelli

A moda anda em alta depois da São Paulo Fashion Week. Nunca, em tão pouco tempo, as roupas de cima ou de baixo foram objetos constantes dos noticiários.

Outro dia, um aspone de um irmão do Zé Genoíno foi pego no Aeroporto de Congonhas com 200 mil reais numa pastinha com a inscrição "No Stress". Mas o que realmente "pegou" foram os 100 mil dólares na cueca... Imagino meu avô calabrês, se vivo fosse, falando de suas ceroulas. A cena inusitada foi motivo de pilhéria da turma do Pânico. E foi risível ouvir e ver os apresentadores de jornal falarem a palavra "cueca" com suas vozes impostadas de seda. Genoíno deu área e o PT tenta, via a popularidade de Lula, restabelecer um pouco a ordem perdida no país. A cueca no noticiário foi mais importante que os milhões de dízimos nas malas da Igreja Universal.

Agora a Daslu. Uma megaoperação chamada Narciso dá indícios fortes que os proprietários da Daslu eram, na verdade, sacoleiros de luxo. A grande diferença é que, ao invés de irem para Foz do Iguaçu, eles íam para a California ou sei lá onde.

Foi um baque para os consumistas de plantão que "a - do - ram" pagar 2 mil reais numa camisetinha "básica" como se estivessem na Rodeo Drive. Nunca passei nem perto da Daslu. Só sei que a primeira hora de estacionamento lá - 30 reais - me garante o "pf" da semana.

Não sei se o nome Narciso foi para distinguir a Daslu ou a polícia. Aliás, eles têm uma capacidade incontestável de criar nomes para operações.

Soa estranho, porém, que parte da mídia ache exagerada a operação. Entendo que o editorial do Grupo Bandeirantes, por exemplo, subliminarmente, defende o status quo da classe dominante, representada pela Daslu, e é equivocado. Primeiro, a questão dos crimes, se houveram ficou relegado a um plano inferior. Em nenhum momento, exceção feita a jornalista Maria Lydia, se falou sobre o ato em si, ou seja, os motivos que ensejaram a operação conjunta da Polícia Federal e da Receita Federal. Também não entendo porque pelo fato de ser a Daslu, a polícia deveria declarar voz de prisão e cumprir seus mandados com rosas e perfume Paco Rabane.

Houve uma crítica ao "exibicionismo" da Polícia Federal. Parece-me um paradoxo, porque a loja, em si, tem como principal característica o exbicionismo. Não estou aqui para criticar quem acha legal comprar uma roupinha de 10 mil reais. Cada um faz o que quer com o seu dinheiro. Mas é inegável que a loja, contrastando com uma favela ao lado, fortalece as diferenças sociais gritantes da sociedade brasileira.

Quanto ao fato da quantidade de policiais podemos até questionar o modus operandi, mas ficou uma sensação de que a mídia ainda prefere defender o "colarinho branco", aqueles que não são tão iguais perante a lei, graças ao capital, independente de onde os "colarinhos" se encontrem, do que a real apuração dos fatos.

Soa estranho, também, que a mesma mídia não se assuste ou pouco fale dos policiais que invadem favelas matando gente inocente. Todos são iguais perante a lei. Infelizmente, a lei não é igual perante todos.

Texto originalmente escrito em 14/07/2005

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei da observação. Pessoalmente achei a ação da Polícia exagerada e desproposital, mas o editorial também exagerou. Agradeço a crítica que está registrada e encaminhada os editores. Maria Elisa Porchat Ombudsman da Rádio Bandeirantes 840 - AM e 90,9 - FM

14/07/2005