por Sylvio Micelli
Muitas pessoas têm me perguntado nos últimos dias, o que fazer no referendo que decidirá sobre o comércio de armas no Brasil. Algumas vêem, por exemplo, motivos cá e lá, que justificam o voto Sim ou Não nesta discussão maniqueísta.
Observei, via rádio e TV, os programas que as frentes parlamentares fizeram e tenho algumas conclusões. Não quero aqui referendar nada, nem mudar o voto de ninguém. Mas tento trazer alguns subsídios ao debate.
Já havia decidido votar Não, bem antes da propaganda. E seu início, em nada alterou minha intenção. Acho a campanha esdrúxula. O Brasil tem coisas muito mais importantes com o que se preocupar. O custo desta "brincadeira" é elevadíssimo. Além disso, o referendo traz, em sua pergunta, um dirigismo flagrante. Transformaram o Não em Sim e o Sim em Não.
Ora. Se perguntassem: "você é a favor do comércio de armas no Brasil?", o sentido é lógico, direto, cristalino. A pergunta é "se você é a favor da proibição do comércio de armas no Brasil?". E aí é que mora o perigo. O sim, ser a favor da proibição é, na verdade, uma negativa. E o não, consequente ou inconsequentemente, uma afirmação. Só isso - o atentado violento ao pudor à nossa língua - já deveria ser suficiente para acabar com o referendo. Porque tenho certeza que haverá muitos votos equivocados em nossa varonil pátria ignara.
A propaganda trouxe mais problemas. Aprendi, na minha lida com a mídia, que a lição número 1 do jornalismo e a principal, é ouvirmos todos os lados. A campanha pelo Sim parece um programa da Rede Globo de Televisão, tamanha a quantidade de atores, atrizes e famosos em geral, que pregam o fim do comércio de armas legais no país. Sabíamos do poder da Globo. Que já elegeu e derrubou presidentes. Mas qual é o interesse subliminar da emissora em defender claramente a proibição do comércio de armas legais no Brasil? Temerá ela, ainda, uma revolução socialista armada?
De outro lado temos a Veja, potência das revistas semanais. Publica uma capa dando motivos que defendem a manutenção da venda de armas no país. Esta posição da mídia, de defender um lado, é extremamente complicado. Cabe à Imprensa elencar motivos aqui ou ali para formar a opinião dos seus ouvintes, leitores ou espectadores. Defender uma posição e vendê-la é o achaque da boa informação que não se deve admitir. Por isso, há muitos anos não leio a Veja, nem assisto à Globo.
Os programas eleitorais do referendo são fracos. Trazem dados aleatórios e números que são espancados até provarem que ambos têm razão. No programa "global" os famosos falam que não se deve ter uma arma. Crianças levam para a escola e matam coleguinhas. Suicidas se rendem ao brilho fácil da arma. Estressados do trânsito se matam por futilidade. No programa do Não, policiais dizem que não é bem assim. Provam por A+B que a maioria das crimes é praticada com armas ilegais e que tirar o direito de quem quer ter uma arma legalizada é um absurdo. E nisso concordo, pois trata-se de influir no livre arbítrio das pessoas.
Recebi por e-mail muitas charges, montagens e afins. Uma, realmente me marcou pela singeleza da frase que diz tudo. "Armas não matam pessoas. Pessoas matam pessoas".
Tudo o mais não importa. É verdade que os bandidos não compram armas em lojas. Normalmente eles importam até de policiais infiltrados por aí. É verdade também que ter uma arma em casa não é interessante, principalmente se você não tiver preparo e cabeça para tal. É, não menos verdade, que nas comunidades mais pobres, pessoas "do bem" raramente tem armas legalizadas e se defendem nesta "Divina Comédia" que Dante tão bem definiu. Quanto aos suicidas, Nietzsche talvez poderia responder se um "verdadeiro" suicida se mata com qualquer coisa ou apenas com uma arma de fogo, talvez mais rápida e menos indolor. Incomoda-me, também, ver o Estado com o controle sobre as armas, o que também é uma verdade. E nunca saberemos quem estará no poder e com quais propósitos. Além disso, existe uma infinidade de armas brancas por aí que farão o mesmo serviço nos grotões mais longínquos, como sempre fizeram.
Ou seja. De fato precisaríamos mudar a cabeça das pessoas - que matam - pessoas. Mas isso o referendo não conseguirá.
Texto originalmente escrito em 08/10/2005
3 comentários:
Mika, bom texto esse seu!
Quase me convenceu a votar pela manutenção das armas nas mãos do povo; porém, nada tira da minha cabeça que uma sociedade organizada na forma de um Estado possa permitir o irrestrito uso de armas que, obviamente, tem o objetivo de tirar a vida de outra pessoa.
Sou contra as armas.
Vou votar Sim.
Sidney Barbosa
A cada dia que passa, impressiona-me mais essa enxurrada de mensagens e propagandas pelo SIM e/ou pelo NÃO nesse referendo do próximo dia 23!
Acredito piamente na sinceridade das pessoas, como nós, que enviamos ou recebemos tais mensagens, sejam elas adeptas do SIM ou do NÃO!
Quanto mais penso nesse referendo, mais me convenço de que somos um povo pacífico, bom, amante da paz e que abomina a violência - com raras exceções, é lógico.
Somos tão pacíficos que iremos votar, sem protestos, nesse referendo.
Causa-me espanto, ainda, - não deveria mais causar - que se fale em desarmamento, em combate à violência como se violência e morte viessem a reboque somente de uma arma, seja ela de fogo, branca, um pedaço de pau, os punhos, etc.
É facil gastar milhões num referendo e, falando em democracia, delegar ao povo o destino do país em relação à violência.
Concordo inteiramente que armas servem para ferir ou matar. Sou contra armas de um modo geral! Não as tenho nem quero ter. A maioria dos que votarão NÃO também não têm, nunca tiveram e nunca terão caso o NÃO seja o mais votado.
Algumas celebridades que levantaram a bandeira do SIM, têm sua segurança particular ou lá o que seja e isso também não vem ao caso.
O que me espanta mesmo é o REFERENDO!
No nosso pais pessoas morrem por falta de atendimento nos hospitais públicos. Ou se não morrem mofam em filas intermináveis e quando conseguem um atendimento pode faltar material, ainda que nem seja sofisticado. Será que ninguém pensa nisso? Não seria violência também e sem arma?
Nossas escolas vão de mal a pior.
Os alunos passam de ano e terminam o básico sem saber nada! Por acaso não se trata de violência?
Nossa polícia é uma piada! Mais mal aparelhada do que os marginais bandidos! A corrupção corre solta no meio da polícia. Eles convivem com os bandidos, fazem pactos com os marginais e muitos - a maioria deles - têm medo de dizer que são policiais.
O prédio da Policia Federal do Rio de Janeiro está caindo aos pedaços! Dali furtaram alguns milhões e mais não sei quantos quilos de cocaína que esperava uma assinatura - pasmem, uma assinatura - para ser queimada.
Isso é violência contra o povo e um deboche!
Não consigo ver de outra forma!
A seca na região norte não aconteceu da noite para o dia... os rios não secaram de repente...
Mas o povo de lá está bebendo água suja e já falta alimento. Isso não se chama violência? DESCASO NÃO É VIOLÊNCIA?
Eu não quero saber de retórica nem de discursos empolados de gente que senta no escritório e escreve teses sobre violência.
É tão fácil tomar conhecimento dos absurdos que estão ao nosso redor!
Hoje fiquei sabendo que na Rocinha, a maior favela da América do Sul, possui um posto policial! UM POSTO POLICIAL e vagabundo! Quem me contou mora lá e trabalha para mim.
Outro dia fiquei sabendo que o governo está construindo uma Universidade na zona mais pobre do Brasil... Sinceramente, eu não entendo mais nada ou então estou ficando maluca! Uma universidade onde o povo nem ler sabe direito... Enquanto a UFRJ cai aos pedaços! Não será violência contra alunos e professores? Ou violência é só matar?
Aos domingos, pivetes andam para lá e para cá na minha rua, assaltando os transeuntes... Ainda que não os matem, não se trata de violência? Eu não vou sair armada para me defender de um menino que me assalta, nunca faria isso! Mas me sinto violentada porque vejo a polícia não fazer nada, ou melhor, vejo a polícia de olho nos camelôs e só!
À noite minha rua virou um deserto. Poucos, pouquíssimos, aventuram-se a sair. Vivemos atrás de grades e eu me sinto violentada... estou viva sim, mas violentada e temerosa de sair à rua.
Não prego nem defendo pois acho tolice o uso de armas como defesa - a maioria não sabe atirar e acaba mesmo sendo morta. Isso é função do Estado que nem do prédio da Policia Federal cuida!
Talvez em algum rincão deserto um fazendeiro precise de uma arma... até para se defender de um animal faminto.
Exasperam-me os discursos a favor do SIM tanto quanto os a favor do NÃO!
Se o nosso povo parasse um pouco para raciocinar, sairia às ruas para dizer um REDONDO E DEFINIITIVO NÃO A ESSE REFERENDO!
Que o governo - no qual votei - tenha a coragem de apresentar ao povo um plebiscito sobre algo onde não haja engodo, embuste partindo dos dois lados!
Cansei de mentiras! Estou cansada de ouvir baboseiras de lado a lado!
Isso não é opção que se dê ao povo, pelo menos nesse momento quando há tantas outras maneiras de violência causadas pelo descaso desse e de outros governos anteriores.
O que dói é que votamos - quem votou nesse governo - para que se fizesse a diferença! O que eu presencio é a desfaçatez de se gastar milhões e deixar a causa da violência nas mão do povo violentado!
Isso tudo me causa náuseas! Não sei se choro ou se rio vendo o povo ser enganado, mais uma vez, crendo em história da carochinha!
Dia 23 vamos brincar de democracia! Gente de barriga vazia ou doente, vai sair para votar no referendo do suposto desarmamento!
Os bandidos estão armados sim... Mas mais armados estão os de caneta na mão!
abçs pesarosos a todos
gina
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