segunda-feira, dezembro 22, 2008

A história através dos carros

Sylvio J. Miceli Jr.

Tudo começou nas eras mais remotas, quando nossos ancestrais inventaram a roda. De lá para cá, o homem sempre procurou tecnologia e conforto, por vezes esquecendo-se do passado e, principalmente, de sua história. Entretanto, sempre existiram seres pensantes na contramão desse panorama.

O que leva alguém a se apaixonar por antigüidades? Para muitos isso é nonsense, contudo para aqueles que gostam de guardar relíquias, trata-se de contribuir para a história do seu país e quiçá do mundo.

Esse é o caso de Og Pozzolli, um nordestino de 64 anos, que há 35 dedica-se a restaurar e conservar carros antigos que, infelizmente, perderam espaço diante de tanto avanço tecnológico.

Em 1958, ele comprou um Lincoln Continental 1948. Quando teve maiores condições de comprar um carro novo, ele ficou com "pena" de vender o "velho Lincoln". À partir daí, até hoje, são 130 carros raros e em estado de conservação excepcional. Og viu-se obrigado a comprar uma chácara, em Cotia na Grande São Paulo, para abrigar toda sua coleção.

Pozzolli, juntamente com Roberto Lee e Eduardo Matarazzo fundaram o "Veteran Car Club do Brasil" que reúne uma série de colecionadores e hoje, é mais uma das 82 associações espalhadas por todo território nacional, interligadas através da Federação Brasileira de Veículos Antigos que mantém a história através dos automóveis. Og é o sócio nº 1 do "Veteran" e Presidente da SPAA - Sociedade Paulista de Automóveis Antigos.

Inegavelmente, ele ajudou a preservar as tradições. Veja só as raridades:

- Lincoln 1937 - só cinco automóveis fabricados. Esta unidade pertenceu ao Governo do Estado de São Paulo;

- Chrysler Imperial 1937 (foto) - pertenceu ao governo de Minas Gerais, para recepção de Getúlio Vargas após o Estado Novo:

- Packard 1946 - pertenceu ao governo Dutra;

- Chrysler Imperial 1939 - perteceu a Antonio de Oliveira Salazar, 1º Ministro de Portugal, único no mundo com carroceria suiça Grabber;

- Moon 1918 - pertenceu ao então Governador de São Paulo e depois Presidente, Washington Luis. Foram fabricados apenas sete no mundo e só resta essa unidade;

Segundo ele, "é muito difícil colocar preço num carro antigo". Isso se deve à falta de "liquidez" e de repente um carro, "pode ter um valor em determinado país e não em outro". Ressalta ainda, que "cada país valoriza muito a sua produção".

Participou ainda de quase todos os rallys do gênero, sendo que um dos mais importantes foi a travessia da Cordilheira dos Andes, numa viagem de 21 dias entre São Paulo e Valparaizo no Chile, sob uma temperatura de -15° C. Nesse rally participaram vários modelos antigos, que chegaram inteiros, mesmo com todos os obstáculos do trajeto.

Atualmente, seu carro do dia a dia é um Landau 82. Ele ainda afirma, "que não há tantas diferenças entre os modelos atuais e os antigos, no que tange à velocidade". Numa viagem comum, como por exemplo Rio-São Paulo, "o tempo de viagem é praticamente o mesmo, pois, qualquer outra velocidade maior, está acima da lei".

Existe ainda, uma grande infra-estrutura de mecânicos e peças antigas, para a manutenção dessas verdadeiras relíquias automobilísticas.

O colecionador mantém todos os carros sobre um cavalete, "para não danificar os pneus e rodas", que são originais. Além disso, seu vasto acervo é procurado por empresas de publicidade, para a gravaçãode comerciais e até mesmo novelas e filmes, como "O Beijo da Mulher Aranha", com Sônia Braga e o finado Raul Julia.

Os carros antigos além de fazerem a história do país, trazem por vezes histórias cômicas, como o Buick, carro esportivo da década de 40, com capacidade para duas pessoas e com um banco de levar a sogra, aberto e sujeito ao vento, chuva etc. Outro acessório dos carros antigos era o farol cata mulata, para se achar casas e números nas escuras ruas de outrora.

O que nós resta, é agradecer a pessoas como Og Pozzolli que junto ao amor pelos carros antigos, não deixou arrefecer uma parte - importante - de nosso passado.

Texto originalmente escrito em 1995 para o jornal "O Metropolitano" da FMU.
Não foi alterado para publicação neste Blog

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